Foto: Walter Firmo/ Vivência Caiçara – Centro Cultural Sesc Paraty
Nessas andanças pelo litoral de São Paulo e Rio de Janeiro, aos poucos estou conhecendo mais povo e a cultura caiçara. Quando eu sabia pouco ou quase nada sobre do que se tratava também me faltava a consciência de que essa população fazia muito mais do que viver perto do mar. Além das belas paisagens (principalmente da Costa Verde entre Rio-SP), a cultura e os festejos dessa região possuem característica peculiares ligadas aos costumes religiosos, culinários e cotidianos cheios de encanto e diversidade. No caminho dessas viagens tive o privilégio e a sorte de encontrar (ou reencontrar) o músico Luís Perequê. Eu já conhecia seu trabalho mesmo antes de chegar pra essas bandas, mas ao conhecê-lo pessoalmente e saber mais sobre seus manifestos e ações culturais, achei necessário compartilhar essa conversa aqui no blog.
Ele é nascido em Paraty, cidade cheia de belezas naturais que infelizmente vive hoje sob a maquiagem do turismo cultural de luxo que deixa as comunidades caiçara à margem de todo o glamour de um centro histórico fotogênico. Perequê começou um trabalho chamado “Defeso Cultural” com o objetivo de lutar pela promoção e resgate das culturas tradicionais de sua região. Sua inspiração também está fundamentada na necessidade de mostrar ao povo caiçara quão rica e diversa são as manifestações produzidas por eles, bem como a importância de guardar tais tradições. Segue um trecho dessa conversa transcrita e logo abaixo uma música que canta e encanta o dia a dia do povo que vive entre o mar e a Mata Atlântica.
“A passagem da Rio-Santos é o grande marco que divide a história da região e todo meu trabalho de música foi muito dedicado às questões ambientais. Participo bastante dos movimentos culturais, da tradição dessa região, toda minha influencia está firmada junto aos cirandeiros e batuqueiros.
A questão da cultura caiçara anda junto ao tema do meio ambiente. E eu tenho certeza e sempre digo que se ainda tem mata, é por que esse povo viveu aqui 300 anos e as matas ficaram preservadas então eu acho que hoje há equívocos em relação as unidades de conservação, que é tirar algumas famílias, esvaziar alguns lugares, é meio bobo.
Porque no fundo o homem que usa a natureza com essa sabedoria toda faz parte da preservação. Essa cultura acontece em cima desse território, com o homem da costeira, o homem que planta e pesca, isso é a cultura caiçara. O cara que tira uma cacheta e faz uma rabeca e toca sua música, faz sua festa. E essa integração da cultura caiçara com o mar e a Mata Atlântica nunca prejudicou, pelo contrário, deveria ser cada vez mais usada na questão da preservação ambiental.
A Educação é algo muito amplo e precisa estar em tudo. É o pilar. Precisamos voltar o olhar para nossa casa. É fundamental que a criança saiba o valor que tem o avô dele dançando aquela manifestação. E nesse sentido, a educação é o caminho perfeito, quando você fortalece o seu universo, a sua cultura, está apto a receber qualquer cultura que não vai ferir a sua. Agora quando sua cultura está enfraquecida, é preciso cuidado com isso porque vivemos em lugares de uma grande população flutuante por conta do turismo. Toda hora chega muita informação e se você não faz a manutenção nos seus hábitos, nos ritos e crenças, com certeza a cultura pode se perder. A cultura é o resultado da convivência, se a gente não convive, não a geramos cultura.
Tem coisa que é particular, que é da sua região, que é da cara do seu povo, da alma do seu lugar. E isso deveria ser ensinado não como cultura geral, mas te ajudar a entender você e o seu entorno dentro desse corpo cultural brasileiro. Quando você tem essa noção, você se valoriza, valoriza os movimentos que há por perto, entende você quanto família, quanto bairro, quanto cidade e quanto país. Isso é identidade cultural.”